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www.portalsucesso.com.br

rock

P

or

T

homaz

r

afael

P

oucas bandas "disseram" tanto quanto o Ultraje a Rigor em

seu álbum de estreia,

Nós vamos invadir sua praia

.Conside-

rado pela crítica um dos melhores discos da história da

música brasileira, aquele LP de 1985 emplacou nada menos do

que oito sucessos nas rádios,inovando com a linguagem debocha-

da, mas politizada do guitarrista e vocalista Roger Rocha Morei-

ra. As canções de Roger ironizavam sentimentos como vaidade,

ciúme e hipocrisia, além de disparar contra a incompetência de

políticos e eleitores. Versos como "a gente não 'sabemos' escolher

presidente" e "a gente faz trilho e não tem trem pra botar", ambos

da clássica

Inútil

, mantém-se atuais 30 anos depois.

O Ultraje gravou outros discos importantes nos anos seguin-

tes, mas aos poucos os intervalos entre um novo trabalho e ou-

tro foram aumentando.O próprio Roger brincou com o fato em

Nada a declarar

, justificando na letra deste single, lançado em

1999, que "não tinha nada pra dizer".Mal sabia ele, à época, que

tanto ainda diria, menos em canções, mas muito em redes so-

ciais e até num talk-show líder de audiência –

The Noite,

com

Danilo Gentili, pelo SBT. Com conta no Twitter desde novem-

bro de 2008, Roger já acumula mais de 150 mil posts na página,

soltando o verbo com o mesmo lado crítico dos anos 80, talvez

agora com um pouco menos de sarcasmo. Porém,mesmo patru-

lhado pelos simpatizantes da esquerda, não perde o bom humor.

E teve, sim, muito a declarar na entrevista que concedeu abaixo

à reportagem de

SUCESSO!

.

» SUCESSO! - Você ainda compõe com frequência?

Roger -

Menos do que antes, já que me falta motivação para novas

composições. Ainda sei compor, claro, embora esta nunca tenha sido

minha maior vocação. O que eu mais gosto é de tocar. Antes de com-

positor ou vocalista, sou músico. O Ultraje surgiu como um grupo de

covers, porque tocar era mais importante pra mim e para os outros

integrantes do que compor nossas próprias músicas. E compor sempre

foi algo muito pessoal. Eu escrevia muito sobre mim, apesar de minha

timidez. Então nunca foi um processo fácil. Mas ainda faço algumas

vinhetas para o programa (

The Noite

) e gosto de produzir em casa,

sem compromisso. Gravo muita coisa no próprio celular. Mas aquela

inspiração maior pra compor já passou.

» Então não há nenhumdisco de inéditas nos planos da banda?

Nada programado, mas nada nos impede de gravar mais pra frente.

É que, sinceramente, é difícil pensar hoje em dia em projetos fono-

gráficos. A indústria musical de antes não existe mais. Mesmo com

toda a tecnologia, sendo muito mais fácil gravar, hoje não há o mes-

mo suporte de antigamente. Sou músico. O ideal é entrar num estú-

dio pensando apenas na música que vou gravar. Sem preocupação

com o tempo disponível, com a produção, responsabilidades que antes

eram da gravadora. E não sou vendedor, nem gerente de marketing,

pra pensar depois na divulgação, distribuição, valores....

Muito

adeclarar

!

Ácidoemsuascríticasnasredessociais,

rogerMoreira

, doultrajea

rigor, faladotrabalhodabanda, depolítica, televisãoeoutros temas

» Acha que ainda vale a pena gravar um CD físico?

É curioso, porque hoje em dia você encontra um fã e às vezes ele te

pergunta se você temumCDpra dar (risos).Acho tão estranho.Os CDs

são feitos agora pra divulgar o trabalho do artista. Pra ser dado. Isso é

praticamente um 'dumping' (risos). Quem vai querer comprar discos,

se alguns artistas dão de graça? A verdade é que antes a gente se divul-

gava na noite, fazendo shows, mostrando nosso trabalho ao vivo.

»

Nós vamos invadir sua praia

foi o primeiro LP de rock no

Brasil a ganhar Discos de Ouro e Platina. É exagero apontá-

-lo como um dos dez maiores do rock e um dos mais impor-

tantes discos da música brasileira?

Sou suspeito pra falar, mas não creio ser exagero. Certamente não sou

o único a achar isso. A canção

Inútil

, que é desse disco, foi eleita pela

Folha de S.Paulo

uma das dez melhores da música brasileira no

século XX. É inclusive o único rock entre as dez primeiras. O álbum

entrou também em listas da

Bizz

, da

Rolling Stone

e de outras

revistas e jornais. E eu nunca votei (risos).

Nós vamos invadir...

,

Cabeça dinossauro

, dos Titãs, e o segundo LP da Legião (

Dois

)

sempre aparecem nesses rankings.

» Você ouve as novas bandas brasileiras?

Ouço muitas bandas novas, daqui e de fora. A Scalene, por exemplo,

é muito boa. Mas acho que falta força no meio. Algumas bandas

surgem, fazem um pouco de sucesso, mas não originam um movi-

mento. Há pouco espaço para elas nas rádios.

» Em1999,oUltraje lançou a canção

Nada a declarar

.Imagina-

va que teria tanto a dizer e escrever mais de 15 anos depois?

Acho que não, mas as coisas mudaram muito. Pra pior. Hoje sou pa-

trulhado simplesmente por exercer meu direito de patrulhar o governo.

Existe censura grande na internet. Por outro lado, vários idiotas por

aí não entendem nada e opinam sem embasamento nenhum. Não sou

obrigado a respeitar as asneiras que leio por aí. Eu estudo e leio muito

sobre política, história, procuro me informar sobre um tema antes de

escrever sobre o mesmo. Não vou comentar sobre motor de caminhão,

porque certamente falarei bobagem. Regredimos muito... Acho que

muita coisa que escrevi nos anos 80, muitas letras admiradas na época,

hoje seriam censuradas ou ridicularizadas. O mundo está mais burro.

» E musicalmente, o mundo também piorou?

Ainda tem muita coisa boa, inclusive no Brasil. Mas sem tanto espaço.

Outro dia li uma matéria que analisava a qualidade das letras de hits

internacionais. Pegaram singles da Beyoncé, por exemplo, e concluíram

que as letras eram quase infantis. Infelizmente, isso não se restringe aos

ídolos do pop americano. Sinto que a palavra "artista" perdeu o sentido

de alguém que faz arte. Artista hoje é sinônimo de celebridade.

» O que acha dos serviços de streaming?