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HISTÓRIAS
T
OM
G
OMES
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E
ra janeiro de 1972. Eu trabalhava no departamento de
promoção e divulgação da RCA Victor, sob as ordens de
Alfredo Corletto.Luiz Gonzaga era contratado da grava-
dora. Durante o ano de 71, o LP
O Canto Jovem de Luiz Gonza-
ga
fez muito sucesso e preparávamos a campanha de seu novo
disco
São João Quente
. Corletto me chamou e disse que eu tinha
que preparar um texto (ainda não existia a palavra press release
naqueles tempos) para distribuir à imprensa falando do novo lan-
çamento do sanfoneiro. Enfim, fui colocado frente a frente a um
mito da música brasileira e durante a entrevista fiquei muito
emocionado, pois a obra do Rei do Baião sempre me encantou.
Fiz as perguntas que sempre tive vontade de fazer e suas respos-
tas trouxeram informações históricas, que aproveitei no texto que
enviamos naquela época para jornais e revistas de todo Brasil.
»
Tom Gomes – Como surgiu o baião?
LUIZGONZAGA -
Primeiro quero dizer que eu nasci no dia
13 de dezembro de 1912, na fazenda da Caiçara, em Exu, Per-
nambuco. Eu sou filho de Januário e Dona Santana, sertaneja
forte e bonita como um pé de amoreira. Se eu nascesse de novo
e pudesse escolher, mais do que eu sou eu não queria ser. Eu
queria acompanhar meu pai nos forrós. Eu queria ser sanfonei-
ro. E assim me tornei um sanfoneiro, solista. Mas queria
cantar e comecei a fazer isso mesmo sem
o diretor querer. Eu tinha que progredir,
que fazer alguma coisa a mais que tocar.
Na RCA, como cantor, fui gravando
uma música aqui, outra acolá. Criei al-
guns ritmos, como o vira-e-mexe, coi-
sas com jeito do norte. Ainda
não era o baião. Eu preci-
sava de um letrista que
me entendesse. Então
apareceu Humberto
Teixeira. Aí eu can-
tava os meus temas e
ele ia fazendo as le-
tras no joelho. Um dia
eu disse: “agora você vai
fazer uma letra chamada
baião”. E assim surgiu o baião.
GONZAGÃOEOSBEATLES
EM1972,
Rei doBaiÃo
FALAVADASUPOSTAGRAVAÇÃODE
ASABRANCA
PELO
QUARTETO , INVENÇÃODECARLOS IMPERIALQUEALAVANCOUSUACARREIRA
DESENHO:
ELIFASANDREATO
»
Como explica esse interesse permanente do público pelo que o
senhor faz?
Como sanfoneiro, procurei me educar. Então eu procurava me
destacar fazendo coisas diferentes.No começo, eu misturava a voz
com o som da sanfona e não coseguia destacar nem uma coisa,
nemoutra.Então descobri uma maneira de tocar quase como fole
fechado, destacando a voz para frente, deixando a sanfona só na-
quela comidinha curta.Eu acho que o público gostou muito disso.
Criei um gênero chamado chamego. Para o público parecia que
eu estava tocando a música com muita velocidade, mas não havia
velocidade nenhuma. Como eu não tenho técnica por não ter
estudado acordeon, encontrei ummeio de encurtar o fole e isso dá
impressão de muita técnica, de muita velocidade, mas não é ver-
dade. Com a minha pobreza de técnica, eu estava descobrindo
também um novo estilo.
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Como surgiu a formação sanfona, zabumba e triângulo, típica
do forró nordestino?
Eu vinha tocando os meus baiões só com a zabumba e estava
procurando um companheiro para tocar esse instrumento, mas
não estava muito fácil de encontrar. Numa das vezes em que fui
a Recife, encontrei um menino vendendo cavaco chinês e tocan-
do um triângulo. Senti que tinha ouvido um ritmo muito inte-
ressante e que aquele ritmo poderia ser encaixado no baião, ao
lado da zabumba, porque faria um contraste muito grande. Até
então não era usado. E a zabumba veio das bandas de couro das
novenas lá do sertão, da minha terra. Dos conjuntos de pífaros:
dois pifeiros, dois flautistas de bambu, dois tocadores de caixa.
Não me interessavam os pífaros, nem as caixas.Eu queria mesmo
era o ritmo da zabumba que incorporei à sanfona.
E então, quando vi o menino tocando o triângulo, falei com ele
logo de cara. O menino não queria me vender o triângulo, mas
me deu o endereço de um mestre ferreiro que fabricava aquele
instrumento improvisado. Procurei o mestre ferreiro, mandei fa-
zer um triângulo e, quando cheguei no Rio de Janeiro, montei
meu trio com o CataMilho e o Zequinha.Um tocando a zabum-
ba e o outro, o triângulo. Aquilo casou e não acabou mais.
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Como foi a história da suposta gravação da música
Asa Branca
pelos Beatles?
O que aconteceu foi uma jogada publicitária espetacular do Car-
los Imperial. Ele tinha um programa no canal 13 do Rio e fazia
verdadeiras artimanhas para aparecer e botar o seu programa no
ibope. Ele dizia no ar que a música jovem tinha muito de Luiz
Gonzaga e explicava o por quê. Mas ninguém dava muita bola
pra ele. Até que um dia o Imperial chegou no programa e disse
assim: "Tá vendo! Cansei de falar e ninguémme deu bola. Ago-
ra quero ver o que é que vão dizer. Os Beatles acabam de gravar
Asa Branca,
de Luiz Gonzaga.