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ELDER
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ALDONADO
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o Brasil, o rock sempre viveu de altos e baixos. Ainda
na década de 60, o estilo chegou ao topo das paradas
através do sucesso da Jovem Guarda, que tinha Rober-
to e Erasmo Carlos,Wanderléa, Cely Campelo, Eduardo Araú-
jo e Sérgio Reis entre seus principais representantes. Mas a
década seguinte não revelou tantos ícones assim.Apesar de uma
emergente cena que descobriu e consolidou bandas e artistas do
porte Secos & Molhados, Mutantes, Rita Lee e representantes
de rock progressivo e rural, era a MPB que dominava o gosto
da crítica e do público naquele momento.
A recuperação do gênero como sucesso de massa só viria a
partir de meados de 1982. Foi nesse ano que a Gang 90 e a Blitz
estouraram com um som que remodelava e reciclava a new wave
de grupos como B52's, Blondie e The Go Go's. Logo, artistas
com outras influências e posturas surgiriam no encalço desse
êxito. No mesmo ano, o Barão Vermelho, filhote direto do blues
e rock stoniano, lançou o primeiro disco. Em 1983, sairia
Voo de
coração
, clássico álbum de Ritchie que contem os sucessos brit
pop
Menina veneno
e
Pelo interfone
. Além disso, Herva Doce,
Kid Abelha, Lulu Santos, João Penca e Seus Miquinhos Ames-
trados, Magazine, Absyntho e Rádio Taxi emergiam do under-
ground rumo ao estrelato.
Esse cenário tão promissor foi fruto de um afrouxamento da
ditadura e repressão que imperava naquele período. Os anos de
chumbo chegavam ao fim e, com a democracia começando a ser
reinstaurada, o rock se transformou na música que representava
os jovens e as importantes mudanças pelas quais o país passava.
“Estávamos em plena ditadura, que não gostava de artistas e
muito menos de cabeludos. Somente quando houve os primei-
ros passos da distensão lenta e gradual, com o afrouxamento da
censura e da repressão, é que o texto livre e a sátira do rock
puderam sair para a rua. A Blitz testou as águas e em seguida
surgiram vários outros, quase ao mesmo tempo”, comenta o
produtor musical Pena Schmidt, que ao lado de Liminha e
Marcelo Sussekind foi responsável pela sonoridade de grande
parte dos álbuns clássicos da época.
Na sequência, por volta de 84, Lobão, Ultraje a Rigor, Ira!,
Titãs, Legião Urbana, Paralamas do Sucesso, Capital Inicial,
Camisa de Vênus, Plebe Rude, Engenheiros do Hawaii, Ne-
nhum de Nós, Inimigos do Rei,Tókyo e dezenas de outras ban-
das despertaram interesse das gravadoras. Mas o gênero não
ganhou automaticamente a simpatia da mídia e dos agentes
políticos. Antes do sistema presidencialista entrar em vigor no-
vamente, no ano de 1985, a censura combateu fortemente letras
que tivessem qualquer traço de subversão.
O primeiro disco da Blitz saiu com duas músicas inutilizadas
mecanicamente. Leo Jaime teve 90% do repertório censurado.
Barão Vermelho, Herva Doce e Sempre Livre passaram pelos
mesmos problemas. As letras ácidas do Ultraje a Rigor também
enVelheÇonaciDaDe
HÁ 30 anos, orockcomeçavaase tornarogÊneromaispopulardopaís,
atravÉsdeBandasqueBeBiamnafontedopunk, pÓspunkeneWWave
tiveram que se adaptar à falta de bom humor dos censores. “No
início da banda, tínhamos que levar as músicas até a Polícia Fe-
deral para a censura analisar.
Zoraide
e
Marylou
não foram libe-
radas inicialmente.O pior é que não diziam o motivo da censura,
tínhamos que deduzir.
Inútil
também foi vetada e só acabou libe-
rada depois que o André Midani deu uma prensa nos censores”,
recorda Roger Moreira, fundador e líder do Ultraje a Rigor.
› terra De gigantes
Na década de 80, o rock só se tranformou em algo realmente
grande em todos os sentidos quando o RPM apareceu.A banda,
liderada por Paulo Ricardo, conseguiu bater todos os recordes
de vendas da indústria fonográfica brasileira até aquele momen-
to. Esse estouro ajudou a reformular todo o mercado de rock da
época e a própria mídia, que abriu espaço em programas de TV
e apostou em revistas segmentadas, como a
Bizz
. Se antes as
bandas contavam com produções medianas ou pequenas e pou-
ca verba para gravar os discos, de 86 em diante a coisa mudou.
“Todo o mercado de rock se profissionalizou naquela época. A
disputa para tocar em grandes espaços aumentou e as gravado-
ras se importavam mais com as bandas. Pelo menos durante
cinco anos, essa foi a realidade”, conta Roger.
Já Pena Schmidt faz questão de relembrar a importância do
festival Rock in Rio I (1985) para a cena. “O Rock in Rio foi
uma cereja em cima do bolo e ajudou a explicar para os comer-
ciantes que aquilo era tambémmercadoria. Abriu as portas para
vendas maiores, com certeza”, explica. O festival, realizado no
Rio de Janeiro entre 11 e 20 de janeiro de 1985, contou com
quase 1,5 milhão de espectadores. Além de grandes ícones da
música estrangeira, como Rod Stewart, AC/DC, Ozzy Os-
bourne, Queen, Iron Maiden e Yes, o evento abriu espaço para
o ascendente rock nacional, com a escalação de Barão Vermelho,
Paralamas do Sucesso, Eduardo Dussek, Lulu Santos,Kid Abe-
lha e dos já consagrados roqueiros Rita Lee, Baby do Brasil,
Erasmo Carlos e Ney Matogrosso.
› geraÇão coca cola
As bandas que emplacaram nos anos 80 eram originárias prati-
camente de três estados do país – São Paulo, Rio de Janeiro, Rio
Grande do Sul – mais o Distrito Federal. A maioria acabou se
transferindo para o eixo Rio – São Paulo. Isso porque, na época,
as duas capitais reuniam a maioria das gravadoras e os estúdios
mais modernos do país.
Se ficassem longe demais das capitais naquela era pré-inter-
net, provavelmente muitas bandas não teriam sido captadas
pelos radares de gente como André Midani (presidente daWar-
ner, gravadora que mais apostou no gênero naquele período),
Pena Schmidt (produtor com vários contatos no underground
paulistano), Liminha (ex-baixista dos Mutantes e produtor re-
fotos: divulgação